domingo, 22 de novembro de 2015

RENNE - guerra de la paz!
















Alain Guerra (Born: 1968 Havana, Cuba) and Neraldo de la Paz (Born: 1955 Matanzas, Cuba).

NOAH - as palavras não bastam!

PALAVRA

As palavras são moedas gastas que os homens trocam em silêncio.
 --- Mallarmé


Infância vem do latim infans: o que não fala.
Ainda que pareça excessivo, para os adultos que somos, sem a voz da criança não há descoberta possível, nem poesia, nem paraíso, nem dor, nenhum conhecimento, nenhuma comunhão.


Em lábios de crianças, loucos, sábios, apaixonados ou solitários, brotam imagens, jogos de palavras, expressões surgidas do nada... Feitas de matéria inflamável, as palavras se incendeiam assim que as roçam a imaginação ou a fantasia.  --- Octávio Paz


ADULTO
Quando uma pessoa está morta. (Héctor Barajas – 8 anos)
Pessoa que em toda coisas que fala, vem primeiro ela. (Andrés Felipe Bedoya - 8 anos)

AMOR
É quando batem em você e dói muito. (Viviana Castaño – 6 anos)
O amor é o que faz as crianças. (Adelaida Restrepo - 10 anos)

ASSASSINATO
Tirar o melhor de uma pessoa (Juan E. Restrepo – 9 anos)

AUSÊNCIA
É quando eu vou morrer. (Yorlady Rave – 8 anos)

BÊBADO
É uma pessoa que mais ou menos quer matar. (Nelson Ferney Ramírez – 7 anos)

CARINHO
Amarrar as pessoas. (Valentina Nates – 9 anos)

CASAL
É onde os pássaros se metem. (Diego Alejandro Tabares, 8 anos)

CASAMENTO
É o pior do mundo. (Ana Cristina Henao – 8 anos)

CORPO
Machucaram meu corpo. (Andrés Felipe López – 7 anos)
Nosso corpo é uma coisa que todos nós seres humanos temos e que nunca devemos deixar os outros tocarem. (Diana Marcela Vargas, 10 anos)
É um rosto que se mexe, ri ,entristece e se sente sozinho. (Mary Yuly Vera – 10 anos)
O corpo é a vida de alguém, porque alguém sem corpo faz o que? (Luisa Fernanda Velasquez, 8 anos)
É como uma coisa que anda em alguém. (Andrés David Posada, 6 anos)
Aquilo que dirige alguém. (Andrés Felipe Bedoya – 8 anos)
Meu corpo é alma. (Juliana Bedoya – 7 anos)
Eu. (Mateo Ceballos – 10 anos)
É no que colocamos a roupa. (Camila Mejía – 7 anos)
É para alguém se encostar. . (Jhonny Alexander Arias, 8 anos)
Serve pra sentir. (Jhonny Alexander Arias, 8 anos)
É que nos dá pensamento. (Blanca Nídia Loaiza, 11 anos)

CRIANÇA
Tem ossos, tem olhos, tem nariz, tem boca, caminha e come e não toma rum e vai dormir mais cedo. (Ana Maria Jiménez – 6 anos)
Humano feliz. (Jhonan Sebastián Agudelo – 8 anos)
Quando nasce é pequenininho e quando cresce um pouquinho e não sabem seu nome chamam de menino. (Daniel Jaramillo – 7 anos)
O que estou vivendo é criança. (Johanna López, 10 anos)
É brinquedo de homens. (Carolina Àlvarez – 7 anos)
Humano em tamanho pequeno. (Alejandro López – 9 anos)
Danificada da Violência (Jorge A. Villegas – 11 anos)
Responsável do dever de casa. (Luisa María Alarcón – 8 anos)

DEUS
Deus e a morte são um. (Edison Albeiro Henao – 7anos)
É uma pessoa que dirige a gente com controle remoto como se a gente fosse seu escravo. (Juan Esteban Ramírez – 9 anos)

ESCRITA

É um senhor que escreve e tem muita autografia. (Weimar Grisales – 9 anos)


Casa Das Estrelas - o Universo Contado Pelas Crianças - Javier Naranjo.

 

LEONOR e ALEX - isso é um convite!


TONY - espelho televisionado.



TODOS - sobre o cárcere: real e simbólico!



quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Quando a imagem da morte é necessária para nos lembrar dos vivos


 Leonardo Sakamoto 03/09/2015


Li reclamações de leitores de jornais e sites indignados com a veiculação de uma imagem do corpo morto de um pequeno menino sírio, afogado e estirado em uma praia da Turquia após uma tentativa fracassada de sua família de atravessar o mar para fugir da guerra.
Publicadas com cuidado que o tema merece, por mais que doam aos olhos e mexam com o estômago e atrapalhem o jantar ou o café da manhã, imagens têm o poder de trazer a realidade para perto.
É fácil ficar indiferente diante de números de violência, mas com rostos a situação muda de figura. Dizer que milhares de pessoas morrem afogadas na tentativa de fugir do conflito na Síria ou de fome na África é uma coisa. Mas mostrar a morte de uma criança, usando as mesmas roupas e, quiçá, o mesmo corte de cabelo que o filho de qualquer um de nós é outra.


Ou trazer o corpo frio de um rapaz moreno, de olhos bonitos, que era marceneiro, e de sua noiva, professora, que gostava de cantar de manhã.

Ou ainda os cadáveres de três adolescentes de uma mesma família, que sempre esperavam até a noite acordadas a chegada do pai que trazia comida para dentro de casa.
Ou de um motorista de uma ambulância, que tinha orgulho do seu trabalho.
O outro deixa de ser estatística, e passa a ser um semelhante, pois é feito de carne e osso e não de números. Nesse momento, há uma aproximação, uma identificação, fundamental para empurrar os espectadores de um conflito para ações, de protesto, de boicote. Seja em uma crise humanitária no Mediterrâneo, em um massacre no Oriente Médio, em uma guerra entre grupos rivais na África, na luta pela independência do Sudeste Asiático ou por conta da violência armada em favelas das grandes cidades do Brasil.

Vivemos em um mundo cuja informação se espalha em tempo real. Mas, mesmo com essa facilidade, muitos se furtam de ter acesso ao mundo.
Ao mesmo tempo, a tecnologia bélica transformou certos conflitos em cenas de videogame, filtrando sangue, suor e vísceras pelas lentes de drones e câmeras de aviões e helicópteros. O que chega, não raro, à tela de uma TV, de um computador ou de um smartphone é algo asséptico, palatável, consumível em doses homeopáticas. Pois não parece humano e sim ficção.
Quando a comunicação é globalizada, cresce a força e a importância de ações globalizadas pela paz. Acertam os veículos de comunicação que divulgaram as imagens, como o UOL, que não configuram sensacionalismo como os programas espreme-que-sai-sangue da TV, que repetem aquilo que já se sabe pelo tesão da audiência. Mas são uma declaração pública contra a barbárie.


Diante disso, a ignorância do que acontece à nossa volta deixa de ser uma benção e passa a se configurar delinqüência social.


fonte: http://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2015/09/02/por-que-publicamos-a-imagem-do-menino-sirio-afogado.htm

terça-feira, 28 de julho de 2015

Confissão

Essa culpa me corrói. Me destrói. Me dói;
Eu não sei lidar com isso. Ninguém deveria ter que lidar com isso. Nenhum pai. nenhuma mãe. Desculpa.
Eu matei meu filho.
Minha criança.
Matei.
A culpa é minha.
Des/culpa.
Só que essa culpa não pode ser minha. Eu não tenho condições de existir repleto de algo e ausente de tudo, porque é assim que eu me sinto nesse momento. Meu corpo vibra, tomado por essa culpa, mas quando eu olho pra dentro de mim, tudo que eu vejo é o nada. O vazio. A ausência.
Repito: essa culpa não pode ser minha.
Essa culpa não deve ser minha.
Essa culpa não é minha.
Essa culpa é dela.
Essa culpa é da Leonor.
Pronto. Agora que eu descobri de quem é, a quem pertence de fato esse veneno que tá me corroendo, ei só preciso arrumar um jeito de transferir esse vazio pra ela.
Ela precisa pagar pelo que fez.
A culpa é dela, não minha.
Não minha.
Vaca!
Ela me tirou minha criança e agora ela vai me dar outra.
Ela vai ser o receptáculo da minha porra e da minha culpa.
Quem sabe assim eu consigo preencher o que me falta?
Essa vaca vai me dar outro filho, outra criança. Meu Noah.
E depois disso ela morre.
Depois disso eu vou conseguir matar de novo.
Só mais essa vez.
Porque depois disso.
Depois disso, tudo vai ser diferente.

Composição Soldadinho de Papel

Todos os outros personagens em volta de mim, no escuro, estão segurando velas apagadas.
Acendo uma a uma e digo para aquela pessoa o que tenho vontade naquele momento.
Em seguida, apago sua vela.
Há uma certa calma na voz, quase um carinho, que potencializam ainda mais a crueldade de Renne.
Termino com Noah, colocando o chapeuzinho de papel em sua cabeça e pedindo desculpas.

Eis o que disse (ou pelo menos tentei dizer) a cada um:

Tony: Você já viu essa notícia no jornal de hoje? Legalizaram o casamento gay nos EUA. Acho uma pouca vergonha essa história de dois homens se pegando. Casamento de verdade é que nem o nosso. Um homem e uma mulher. É assim desde o início dos tempos, pra que mudar agora? Reclamam tanto da ditadura militar, mas tão aí agora com essa ditadura gay! pelo menos na nossa não tinha essa putaria toda. Cê não acha?

Alex: Eu acho que nunca vou entender você. Que porra é você? Menino-soldado-menina. O que é que você quer ser quando crescer? É melhor decidir logo, porque eu tenho uma novidade pra te contar, garoto/garota: você já cresceu. E eu continuo achando que eu nunca vou entender você.

Leonor: Já reparou que desse mundo de 5 pessoas, só eu e você somos uma coisa só? Todo mundo é dual, mas eu e você não. O macho e a fêmea. Opostos, e ao mesmo tempo, iguais. Yin e Yang. Você pra mim é tudo que há de mais errado nesse país. Então por quê é que eu não consigo deixar de me ver quando eu olho fundo nos seus olhos?

Noah: Meu criança. Desculpa o pai, tá? Você tá fazendo uma falta tão grande, minha filho. Eu que abri um buraco na sua barriga, mas quem tá com um vazio que não dá pra preencher nunca mais sou eu. Eu tô oco, criança. Me desculpa. Me desculpa. Desculpa o pai. Descul.

Composição Renne, Tony, Leonor e Noah (Dança)

Noah faz pirraça com Tony na parede do lado direito, enquanto Renne corre atrás de Leonor, provocando-a.
Noah bate na parede; Renne e Leonor param de correr; Tony e Renne falam ao mesmo tempo: "Não bate na parede!" (Renne para Leonor e Tony para Noah).
Noah e Leonor ficam de joelhos, testa no chão, Leonor ao centro e ao fundo e Noah à frente e à esquerda.
Tony e Renne se cruzam.
Tony fala para Noah parar de birra; Renne pede para Tony fazer alguma coisa, pois Noah está chorando de dor.
Renne ajoelha-se ao lado do filho, mão no abdômen dele, estancando o sange; Vê o sangue nas mãos; Arruma o corpo do filho e joga-o na vala.
Renne desaba.
Leonor canta. Renne canta. Noah canta. Tony canta. Dream a Little Dream of Me, claro.
Renne levanta, frágil.
Tony pede pelo filho.
Renne se aproxima, Noah, entre os pais, o afasta.
Renne ajoelha e pede desculpas.
Tony e Leonor sentam ao fundo, em espelhamento uma da outra.
Noah e Renne conversam em "intergalactiquês"
Renne e Noah ouvem algo lá fora.
Noah sente o tiro, Renne o acalma: "passou, passou".
Juntam-se todos ao fundo.
Renne desaba, bate a cabeça na parede.
Noah se afasta e volta a cantar.
Leonor e Tony dançam.

quinta-feira, 9 de julho de 2015

composição ----

COMPOSIÇÃO  ----

[Um método para revelar a nós mesmos pensamentos e sentimentos (sensações) escondidos sobre o material].

EU, ATOR.
ELE, PERSONAGEM.
NÓS, corpo.

O objetivo é desenvolver uma composição a partir do confronto ATOR x PERSONAGEM. Selecionar, articular e arranjar os componentes da lista que segue, transformando-os numa apresentação cênica de, no máximo, 03 minutos. A mesma deverá ser apresentada pelos atores no ensaio do dia 17 de julho de 2015.

A lista se transforma num modo de remisturar o mundo, quase colocando em prática aquele convite de Tesauro a acumular propriedades para fazer brotar novas relações entre coisas distantes ou, em qualquer caso, para colocar um TALVEZ sobre aquelas já aceitas pelo senso comum.
Umberto Eco, em A VERTIGEM DAS LISTAS

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Lista ----

ANTES DE TUDO, RELEIA SEU CADERNO DE CRIAÇÃO E A DRAMATURGIA
  

01 ___ GESTOS PSICOLÓGISCOS e GESTOS SOCIAIS investigados no ensaio 06/07/2015
http://issoeumconvite.blogspot.com.br/2015/07/gestos-psicologicos-e-gestos-sociais.html

02 ___ POSTAGEM “ENSAIO #01” 

03 ___ COMPOSIÇÕES #01

RÚBIA --- http://issoeumconvite.blogspot.com.br/2015/04/composicao-1-respiracao.html
obs.: cada ator usa, como referência, a sua composição.

04 ___ UM OBJETO

05 ___ UM SILÊNCIO

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Lembrando que não precisamos dar conta de tudo. A lista é um referêncial. São modos de criar pensamento e fisicalidade sobre o que estamos pesquisando. É processo, experimentação.  É importante selecionar, escolher um recorte. São possibilidades. É meio, não fim.
{LER POSTAGEM “O ATOR-BRICOLEUR}




arrasem! errem!
pesquisem!
isso é um convite!
até lá!

davi ---

Gestos psicológicos e gestos sociais ----









quarta-feira, 8 de julho de 2015

ATOR-BRICOLEUR --- Por Flávio Souza

ATOR-BRICOLEUR ---
Por Flávio Souza

O bricoleur é um conceito apresentado pelo antropólogo belga Lévi-Strauss, em seu livro “O pensamento selvagem” (1989), onde afirma que :


O Bricoleur está apto a executar um grande número de tarefas diversificadas porém, ao contrário do engenheiro, não subordina nenhuma delas à obtenção de matérias-primas e de utensílios concebidos e procurados na medida de seu projeto: seu universo instrumental é fechado, e a regra do seu jogo é sempre arranjar-se com os “meios-limites”, isto é, um conjunto sempre finito de materiais bastante heteróclitos. (LÉVI-STRAUSS, 1989: 33)

Trabalhar com a bricolagem pressupõe produzir um objeto novo a partir de fragmentos de outros objetos, no qual se podem perceber as partes ou pedaços dos objetos anteriores. A ideia de que “isso sempre pode servir”, de selecionar, de destacar do resto aquilo que meu imaginário já elabora inicialmente de alguma forma, percorre a prática da bricolagem. Agregamos a esta prática o exercício de desenvolver “maneiras de lidar com”, desmontar, recompor. Caracteriza-se, assim, o bricoleur como aquele capaz de adaptar e de utilizar no seu trabalho quaisquer materiais encontrados, assimilando, re-elaborando e propondo que determinado material sirva na construção de outra categoria de objeto.
Mesmo estimulado por seu projeto, seu primeiro passo prático é retrospectivo, ele deve voltar para um conjunto já constituído, formado por utensílios e materiais, fazer ou refazer seu inventário, enfim sobretudo entabular uma espécie de diálogo com ele, para listar, antes de escolher entre elas, as respostas possíveis que o conjunto pode oferecer ao problema colocado. Ele interroga todos esses objetos heteróclitos que constituem seu tesouro, a fim de compreender o cada um deles poderia significar. (LÉVI-STRAUSS, 1989: 34)

O conceito de bricolagem comporta intrinsecamente uma operação lúdica. O artista que trabalha consciente da tarefa da bricolagem deve estar conectado com seu interior, ser apto a responder prontamente e apropriar-se do que lhe foi dado, gerando um novo produto, uma produção artística calcada na experiência pessoal. O produto gerado pelo bricoleur de alguma forma mostra um pouco do que é o artista, pois o objeto criado é uma forma de comunicação com o mundo, expondo seu universo lúdico, seu imaginário e sua capacidade de articular discursos distintos.

A arte se insere a meio caminho entre o conhecimento científico e o pensamento mítico ou mágico, pois todo mundo sabe que o artista tem, ao mesmo tempo, algo do cientista e do bricoleur: com meios artesanais ele elabora um objeto material que também é um objeto de conhecimento. (LÉVI-STRAUSS, 1989: 38).


O “ator-bricoleur” agiria, portanto, como um artesão que, se apropriando e transformando o material que chega até ele em expressão teatral profundamente ligada com sua natureza, é também capaz de responder aos estímulos a partir de seu inventário pessoal e elaborar algo novo a partir de vários materiais distintos. O ator não abandona sua formação, sua história pessoal, sua memória nem as analogias possíveis que o estímulo dado lhe provoca. Tecnicamente, a busca seria por uma capacidade de resposta imediata do corpo e dos procedimentos técnicos disponíveis de cada um: a prática do improviso, do jogo e da contracenação. O “ator-bricoleur” desenvolve o seu discurso sem compromisso com uma unidade totalizadora, nem com a elaboração de uma narrativa linear.
O corpo do ator pode ser considerado aqui também como amálgama dos diversos materiais a serem combinados para formar a obra. O que podemos destacar então como material nesse caso? Matteo Bonfitto (2002) elabora o conceito de material, a partir de Aristóteles, entendendo que:

(...) o que causa a transformação da matéria em material é justamente a aquisição, por parte da matéria, de uma função que contribui para a construção da identidade do objeto do qual é parte constitutiva. Portanto, por material pode-se entender qualquer elemento que adquire uma função no processo de construção da identidade do próprio objeto. (BONFITTO, 2002: 17)

O bricoleur pode perceber nas coisas ao seu redor tudo o que potencialmente venha a se tornar material para o seu trabalho. O ator-bricoleur igualmente entende o que pode se tornar material para a construção do seu trabalho artístico. Desenvolve a capacidade de dar uma função para determinado aspecto do seu trabalho, de modo que ele faça parte da própria identidade do trabalho artístico produzido. O corpo do ator se torna, então, como Patrice Pavis (2005: 139) coloca, o amálgama dessa justaposição, dessa mistura, dessa junção, dessa colagem de materiais diversos. O ator deve então compreender que a articulação do trinômio espaço/tempo/ação é a chave principal para se tomar a bricolagem como procedimento artístico.
Refletindo sobre procedimentos técnicos de trabalho, destaco então alguns elementos estruturantes da prática da bricolagem. Seriam eles: relação com o inventário pessoal, a apropriação, relação com o fragmento e a desconstrução e composição.

A relação com o inventário pessoal designa, a meu ver, algo além da relação do artista com a memória. A ideia de inventário pessoal abarca a relação do artista com todo o seu instrumental técnico adquirido ao longo do tempo, sua maneira de entender e perceber as coisas ao seu redor, a sua visão sobre o material a ser trabalhado, sua compreensão e também seu memória, seu passado e sua relação com ele. Lèvi-Strauss (1989) aponta que o primeiro contato do bricoleur diante de um projeto é uma atitude retrospectiva, uma volta a todo o seu arsenal e potencial de criação um contato direto com sua natureza criadora e criativa. A criação se daria no campo da percepção de como o material afeta o artista, que pontos em seu inventário são despertados e estimulados a desenvolver uma relação criativa e produtiva.


Fragmentar também é uma forma de organizar a cena onde podemos confrontar e ressaltar particularidades e significados do texto ou do tema. No trabalho do ator, a fragmentação pode ser um desafio técnico onde se passa com uma ruptura de uma coisa para a outra. Isso exige uma consciência daquilo que se deve fazer concretamente, quais ações e a elaboração física da cena. Exige uma consciência mais ampla, onde é preciso entender a criação a partir do que a justaposição dos fragmentos pode significar; a bricolagem pode ser aqui compreendida como o resultado final dessa colocação de um fragmento ao lado do outro.

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Cozinha do ator - sobre Leonor

Não para, sempre há movimento.
Se não corre, anda. Se não anda, mexe o pé. Se não mexe o pé, mexe a mão. Se não mexe a mão, mexe o dedo. Se não mexe o dedo, mexe a língua. Se não mexe a língua, sua cabeça com certeza está em movimento.
Pesa. O peso pesa.
A luta é sempre por não desistir.
O corpo lutando para o corpo não cair. Para a cabeça não explodir.
Tenta ser girafa, mas está uma medusa.
O sapato machuca. Não há meias. Seu calcanhar está em carne viva.
Sua roupa fede pois não há condições para um bom banho.
Seu cabelo virou uma mistura de lembrança de si e asco de sebo.
Uma prisão que não é apenas externa, mas em si mesma.

Corpos de Leonor

1) ANTES DO EVENTO TRÁGICO: a felicidade, a comunicação, o trabalho, a realização. Uma postura aberta, palmas das mãos para frente, boca entreaberta expressando a vogal A com um sorriso. Mão direita como quem informa algo que está escrito em um quadro negro e mão esquerda relaxada pronada à frente. Pés apontados para fora com pernas numa leve abertura.

2) DEPOIS DO EVENTO TRÁGICO: peso, tensão, necessidade de manter-se de pé. Com o corpo relaxado, os braços tentam puxar a cabeça para cima numa tentativa de levantar o corpo.

3) CORPO SOCIAL: medo, tentativa de afastar, mas uma positividade que se expressa pelo rosto. Joelhos levemente dobrados, mãos para frente na tentativa de parar alguém, dedos mais relaxados. Um rosto que TENTA expressar algo diferente do medo expresso pelo corpo.

4) CORPO ÍNTIMO: fim, fracasso, cansaço, sono que não se permite dormir. Deitada em posição fetal, a mão esquerda tampa os olhos e o cotovelo aponta para o céu. Mão direita tocando levemente as cabeças.

Antes da tragédia: corpo aberto, comunicativo.
Depois da tragédia: tentativa constante de se reerguer.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

Grupo em dia frio - Composição

Mãe e Filho. Discutindo. Discussão entre Rene e Professora, simultâneo.
Um tapa na parede, de rebeldia, de pirraça. O choro vem na garganta. A raiva?
O choro é de morte. De tiro.
Agora morto, Noah é enterrado numa vala pelo próprio pai.
Agora morto, Noah encontra sua mãe no sofá de casa. Canta.
O pai chega. Noah está entre. Noah impede uma discussão, ele está entre um e outro, num mundo contraditório.
Ama o pai, tanto, tanto. Quer fazer carinho, quer brincar de ET, quer muito, quer rir tanto, quer ser importante, quer atenção.
Barulho na rua. Noah foi atingido. Sente a dor, porém silencia.
Um grupo de pessoas muito conhecidas, ligadas por um elo estranho, forma-se no fundo do palco. Noah caminha em direção a eles, quer se juntar. Quase dialoga com as mãos da professora, quase se acalma com o toque da mãe em seu ombro.
Noah afasta-se para observar, ele vê sua própria ausência transformando aquelas vidas.




O tempo cuida de tudo. Vai ficar bem.
Dançam e riem, sim, já podem sorrir pra esquecer a tristeza e a brutalidade que acometem seus dias.


A luz se apaga.


Lu

segunda-feira, 29 de junho de 2015

uma visita.

Tony assiste televisão no meio da madrugada, sentada no chão, ao lado do sofá. A ladainha de uma fala qualquer e incessante preenche todo o espaço. Faz frio. Noah a cobre, mas não é percebido por ela. Sinos. Um sapato que cai no chão. Um barulho. Um susto. É o sapato de Noah. tony olha pelo corredor e vai atrás de não sabe o que até que é levada por um toque, que mais lhe parece uma brisa doce. E ela se entrega, feliz. Ela conhece aquele toque, entende aquele sopro. Se entrega mais. Ri. Como é gostoso dançar sem música, dançar de ar e... Noah. É ele. Ele, enfim. Mas o que? Alguma coisa sobre as cebolas, ele diz. Não. Não, não. As cebolas não. "Me deixa fingir, Noah. Me deixa fingir!" Ele se assusta, senta. Ela, da raiva, chega a implorar. "Me deixa fingir, Noah... deixa? Deixa..." E se aninha perto do filho.

sobre meus percalços com tony

é difícil. tem sido difícil. e fico dizendo pra mim mesmo que é normal ser difícil. mas fico feliz porque entendo que a cada dia eu realmente estou tentando alguma coisa diferente: uma preponderância na apatia num dia, um peso maior no sofrimento em outro, uma rigidez maior aqui, uma secura mais intensa ali. é como se eu estivesse investigando um pouquinho cada uma dessas energias, sem avançar muito nelas, como quem tateia um campo novo, como quem coloca a ponta do pé na água pra sentir se está muito fria.

li isso alguma vez em algum canto: ao me aproximar de tony, sinto como se provasse um calçado apertado, que incomoda e machuca mas que com o uso vai se moldar às minhas próprias formas.

já entendi que ela não precisa sofrer. que ela não precisa ser coitada. que tudo isso, além de não ser o seu lugar, a enfraquece como personagem. é preciso entender que ela pode não ser legal. ela não precisa agradar. preciso desvitimizá-la para mim mesmo, e começar a trabalhar a partir de outros lugares.

além disso, quero começar a experimentar reter mais as emoções. é como se, até agora, eu estivesse deixando meu corpo ser transbordante de emoção, com ele jogando solto o que sente. aos poucos, quero começar a retê-las mais. acho que vai pra além da própria interpretação, que é uma medida certa entre monstrar e esconder: a própria tony tem disso (o velho papo sobre sua dialética no último post).

quando li a mensagem ontem, senti muita pena de não termos tido encontro hoje. mas esse momento de parar para organizar as sensações e as criações também está sendo muito bom, bastante construtivo. fico ansioso para que a sexta chegue logo...

sai daqui e não volta sem o meu filho.

Tony assiste televisão enquanto se desmilingue no sofá. Renne entra. Tenta consertá-la; ela se desmilingue. Conserta-desmilingue, conserta-desmilingue, conserta-desmilingue. Tony se desvencilha dele (por que?), se recompõe e vai em direção ao quarto de Noah. Ele não está. Volta exasperada: "Renne, o Noah não tá no quarto, Renne. O Noah não tá no quarto dele." Ele tenta detê-la. "A gente precisa fazer alguma coisa, Renne". Ele diz que o filho está no colégio, ao que ela se tranquiliza. Tudo bem, então. Podemos aproveitar para acertar os planos da festa de aniversário intergalática. "Eu vou precisar conseguir uma fantasia de ET que caiba em você! Imagina, Renne, eu e você vestidos de ET?" E precisamos também pensar nos balões verdes, e nas bebidas. "Não dá pra ter só whisky, Renne!" E aqueles copinhos de marciano que ela viu no Centro, que são caros mas que o Noah vai ficar doido. Renne continua embarcando, até que Tony diz (provoca?) que vai buscar o filho no colégio, assim eles podem conversar os três. É isso. Ele não deixa, se interpõe no caminho e pergunta dos remédios. "Eu não quero remédio, Renne. Eles não dão conta." Seca e certeira, mas a secura não vem de descaso; pelo contrário: vem de uma objetividade carregada de uma absoluta necessidade. "Eu quero o meu filho, Renne. Eu-quero-enterrar-o-meu-filho. Eu nunca te perguntei, Renne, onde você tava, que horas você ia voltar, o que você tava fazendo. Mas agora eu quero saber, Renne. Agora eu preciso saber." Renne murmura algum pedido infame de desculpas, enquanto seu corpo se desfaz em direção ao chão. É o ápice da inversão de papeis, de uma crueldade que a alimenta. "Vem, Noah, vem ver seu pai caído no chão. Você não consegue nem chorar, Renne. Chora, chora que eu quero ver." Recompõe-se, mas agora é diferente. É para si mesmo. Ela disse o que precisava. Volta à televisão.

quinta-feira, 25 de junho de 2015

Corrida _ ensaio 22/06/2015

Eu só consigo correr.
Não consigo pensar em outra coisa para fazer aqui.
Estou exausta.
Isso não é brincadeira.
Eu quero parar de correr e inventar.
Fazer outra coisa.
Alguma coisa diferente.
Que me renove nesse espaço. Nesse tempo.
Mas a única coisa que consigo fazer é correr.
Sempre tive liberdade para correr por ai, mas nunca corri.
Não no sentido real.
Mas aqui, não consigo parar de correr.
Parece que é na corrida que eu encontro atividade com sentido. É onde encontro algum tipo de liberdade.
Eu só consigo correr.
Não consigo pensar em outra coisa para fazer aqui.
Estou exausta.
Isso não é brincadeira.
Eu quero parar de correr e inventar.
Fazer outra coisa.
Alguma coisa diferente.
Que me renove nesse espaço. Nesse tempo.
Mas a única coisa que consigo fazer é correr.
Sempre tive liberdade para correr por ai, mas nunca corri.
Não no sentido real.
Mas aqui, não consigo parar de correr.
Volta.
Preciso de ajuda.
Preciso de um sentido para estar aqui.
Eu não consigo parar de correr.

Sobre partitura da corda

Só se ouve.
Respirações e tentativas de fala.
Ela corre. Para.
Tensa, levanta as mãos.
Respiração ofegante.
Um tiro.
A mão vai ao peito.
Caminha. Trêmula.
Tem suas mãos amarradas.
Perde suas referencias. Cambaleia. Totalmente sem equilíbrio.
Olha para lá, olha para cá.
Olha para lá, olha para cá.
Encontra os seus. Seus o que?
Vê seu passado próximo. Memória.
Tenta falar. Tenta gritar.
Apenas onomatopeias saem de sua boca.
Tem sede. Lábios secos.
Desmaia.

terça-feira, 23 de junho de 2015

Composição Renne e Tony

Renne entra transtornado pela visão do filho morto;

Tony vê TV, desabando o corpo anestesiado;

Renne busca aprumá-la freneticamente, agarrando-se à última espécie de controle que acredita ainda possuir - Tudo o mais ruiu, que ao menos isto se mantenha como deveria;

Tony vai ao quarto de Noah - ele não está lá;

Renne tenta acalmá-la, violentamente a joga contra a parede e diz que Noah está na escola;

Tony aproveita a chance para discutir a festa de aniversário - fantasia, balões, bebidas, copos de ET - e quer sair para buscar o filho no colégio;

Renne a impede, em apoios e contrapesos, e pergunta se ela já tomou o seu remédio;

Tony o empurra e friamente o confronta - Você matou o nosso filho e o jogou num valão. Eu não enterrei meu filho;

Renne pede desculpas e desaba no chão;

Tony chora um choro que é realmente seu pela primeira vez desde que o filho morreu.

domingo, 21 de junho de 2015

René

Um general lidando com a culpa de ter matado alguém que não devia.
Carne e Metal.
Duração.
Fluxo Interrompido.

As primeiras impressões que tenho deste homem são de crueldade. Vilania. Tintas Fortes, carregado no negro e no vermelho. Como não cair nesta armadilha do "vilão" e criar um personagem humano? Um pai. Um marido. Um homem.

Tenho buscado uma investigação através das primeiras diretrizes que me foram dadas há tantos ensaios passados. Quatro pontos cardeais que vêm me servindo de bússola: No Norte, a Culpa versus o Dever; no Leste, a Duração; no Oeste, o Fluxo Interrompido; e ao Sul, a Carne e o Metal fundidos. Ainda não senti que as possibilidades de pesquisa em cima desses 4 focos se esgotaram. Nem acho que elas vão. A duração das ações, interrompidas por rompantes e abandonos de força, deste ciborgue de carne e metal obcecado por cumprir seu dever e corroído pela culpa resultante disto meu parece um quadrante rico e poderoso. Um pai/soldado que precisou substituir a carne que dói pelo metal frio para seguir em frente. Mas a dor daquele, por mais que se combata, sempre prevalece à frieza deste.

Interessante reparar nas relações de poder e como elas têm se estabelecido: Com Noah, me parece uma relação igualitária; ambos são polos passivos e ativos ao mesmo tempo no jogo de poder, visto a cumplicidade ali existente. São parceiros. Com Toni, há uma relação mais dominante, um resquício do patriarcado, da "tradicional família brasileira". Com Leonor, apesar da óbvia relação opressor/oprimido, vejo-me dominado pela força desta mulher. Tenho medo dela. Do que ela representa. Com Alex, ainda não tive chance de investigar mais a fundo. Ainda não sei ao certo que relação é esta.

Acho curioso que, pelo menos nas improvisações até o dado momento, este personagem tão hierarquicamente superior aos demais, tão poderoso e opressor, seja ao mesmo tempo o mais frágil, o mais despedaçado.

Estou feliz com este desafio. De poder mexer com um sentimento tão perigoso que é a culpa. Que maluco estar feliz por isso, eu hein...

Por enquanto é isso o que acho do René. Sentei aqui e vomitei essas palavras, espero que tenha conseguido me expressar direito.

<3

sexta-feira, 19 de junho de 2015

Primeiras sensações Noa


A criança que deseja uma festa de aniversário.
A criança que se interessa pela imensidão e a falta de contorno do mundo.
A criança que morre e ainda assim está lá, em carne, osso, respiração, agonia.

Estou a investigar este ser.

Este pequeno grande ser humano possui ternura, amor e também crueldade dentro de si. Ele ou ela, a criança, Noa. Quero dizer "criança" no sentido mais concreto - pra ele não importam os tais questionamentos sobre gênero, ele é pleno em si mesmo e aberto a experiências sensoriais. Fico feliz por estar enxergando isso agora. Nós é que somos hipócritas demais!!
Uma criança é um mergulho numa cachoeira. E isso se aproxima muito do que desejo enquanto artista: mergulhar, adentrar, deixar a pele respirar todas camadas da composição que estamos tecendo juntos. Quero estar entregue e deixar esse personagem agir, falar, repetir gestos, rir, chorar, ganhar concretude.

É complexo demais interpretar a infância, tenho medo, pode ficar na superfície.

Estou feliz com este presente, FELIZ é a palavra no momento. E MEDO é a palavra que vem quando penso o tamanho do desafio. A relação de Noa com a mãe e o pai começa a se delinear a cada improvisação (a vontade de se aproximar do pai; o desejo de seguir a "imagem" que o pai assume diante da família;  o pai parece ser mais parceiro que a mãe;  Com a mãe, o afeto vem de outro modo, de forma mais crítica. Noa conhece bem o jeito dessa mulher, sabe o que a faz rir e chorar, tem amor por tudo isto, um amor crítico e dependente - eles precisam um do outro, incondicionalmente). Na relação com a professora , me surgiram sensações como: respeito, admiração, amizade, receio, coragem. São cenas mais poéticas, talvez, não que sejam "românticas" mas podem ganhar uma outra dimensão, outra atmosfera.

As improvisações estão se tornando vivências muito necessárias para as relações entre estas figuras.  O elenco todo está experimentando sem receio, jogando com as diversas possibilidades pra depois entender o que fica neste trabalho.

Queria entender melhor esse "desejo da festa", ainda não consigo encontrar no meu corpo um lugar de onde venha esse desejo, por que uma festa, por que sobre ETs, enfim, são perguntas que fico me fazendo.  Isso não está muito claro nas minhas sensações até agora.

Vamos vendo.

Lu.



quinta-feira, 18 de junho de 2015

tony. to-ny. toní.

escrever sobre meu encontro com tony me parece quase cruel. me sinto um pouco exposto, como se tivesse me abrindo naquilo que ainda é por demais meu, mostrando aquilo que eu ainda nem sei o que é: que forma tem?, que cor tem?, que cheiro tem? não sei nem que palavras usar para começar.

mas é justamente por isso que acho que é legitimo, importante e necessário escrever. porque começo a achar que meu ponto de encontro inicial com tony não deveria vir de retenção, mas de explosão. explodir para depois reter. esse é meu desejo e é nessa direção que vou me desafiar. ou pelo menos tentar.

dito isso - que já é muito -, comecemos. acho que tenho que começar a entender tony por seu lugar mãe-mulher, em termos de sua essência. é engraçado como no texto ela não vive os outros personagens - apenas seu marido e seu filho. e acho que isso diz muito sobre sua vida. ao mesmo tempo, é preciso tornar também presente, nesse meu primeiro contato com ela, a sua dialética permanente entre mostrar/esconder, ser/parecer, desequilibrar/equilibrar etc. ainda não sei qual o par mais adequado, mas sei que ela ronda essa dialética constante. depois, será preciso também descobrir o momento em que, sozinha, não é preciso parecer, equilibrar, esconder - mas apenas ser. e, então, o que se é?

algumas referências me passam pela cabeça: as horas, requiem para um sonho, para sempre alice, mommy. nas primeiras imagens que me vieram à cabeça durante a leitura do texto, eu a via de cabelos bem pretos, curtos e um tanto lisos. pele bem clara e roupas também claras. e um ritmo lento. acho que ela é chique.

nota pessoal para não esquecer: aos poucos, ao longo do processo, estudar a relação dela com a tv; os diferentes estágios, as mudanças sutis. talvez seja o personagem com quem ela mais se relacione e, portanto, a relação que mais pode mostrar ao público quem (não) é essa mulher, em termos de dramaturgia das ações.

ufa, consegui. e nem foi tão doloroso como achei que seria. fico por aqui - agora até com uma certa vontade de voltar em breve a escrever ;)

terça-feira, 16 de junho de 2015

Mistério Leonor

A palavra que resume Leonor, até esse momento, é mistério.
Mistério pois a única coisa que sei é que ela sabe um segredo e está presa por isso.
Fico me perguntando sobre a vida dessa mulher. Ela tem família? Quais seus desejos? Ela quer sair? Ela tem medo de sair pois pode ser assassinada lá fora? Ela pode ser assassinada na prisão? Ela tem algum tipo de segurança de vida? Ela desejaria nunca ter descoberto esse segredo? Ela já falou para alguém mesmo? Se sim, para quem? Ela precisa protejer essa(s) pessoa(s) que também sabe? Ela ama alguém lá fora? 
Enfim, perguntas e mais perguntas é o que tenho sobre essa personagem.
Nessa fase de ensaios, sou uma espécie de jornalista frente a ela.
E ela corre...

quarta-feira, 13 de maio de 2015

#26.04.2015- Diário de um tiro

#26.04.2015-  Diário de um tiro


(Domingo), 18:45, estaciona uma Van, sai uma moça, Ana, carregando um acordeon, ela acena para os de dentro do carro, sorri, despede-se. Entra na padaria, compra pão, queijo e manteiga. 
Caminha na rua em direção a sua casa. Cantarola canções, acena para a vendedora de açaí. 
      
(Sábado- dia anterior) 
       Cadu corre, grita para dentro do portão.
Sirenes os despertam 
 (tiro) (tiro) (tiro) ttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttt
.............................................................................................................................
     
(Domingo)
Ana, entra no elevador, aperta 8° andar. 
Marina abre a porta. Ela a abraça, tira seu acordeon e senta no sofá. 

Ana abre seu e-mail. 
     Mensagem nova no grupo.  <mineirinho_@Clarice Lispector.com>
e um pedido,  [composição]. 
Ela pesquisa formas sonoras de revelar um tiro cênico.
Lembra dos estalos de papel que faziam na escola.
       Procura folhas, acha uma pasta de partituras -  puxa aleatoriamente- 
pega a da música Bife e pratica a cena.

(segunda)
09:45, atrasada, encontra o porteiro que comenta sobre o acontecido tiroteio.
Conturbada e ainda sonolenta, abre o portão, acena um bom dia para ele e sai.
        Segue com os olhos as manchas avermelhadas na calçada
Vizinhos comentam segurando seus cães e crianças passam para o portão da escola.
        Ana chega no ensaio, prepara o estalo

                         (Tiro) 


Cai
    Ana: Mais um,
                              Todos os dias.
          Um Grito extasiado adormece suas nervuras.
 Um  homem e um sopro metálico.
             Um, joga cápsulas e assina papeis de contratos,
 outro, fala seu nome:
 (Ana interpreta o menino da rua) Cadu (cai)    
Ana: Chamou o  tal destino. 
                                    Segue a fila--------------------- fila>>>>>>>>>>>
       
                         logo se faz, mais uma vez,
                                       A  roda,
               A roda de gente na rua.
               Teve foto, teve choro, teve bolo, teve curioso, teve TV, 
                                      E teve a mãe.  (silêncio)

             Ana: Teve o que merecia!! disse o cidadão do portão.  
                           

                          Agora a formiga desvia o corpo miúdo
                                          e faz força pra passar.
                                                    muita gente, muita gente
                                                             muito peso, muito peso, muito peso
                                                                          muito mundo, muito mundo.

(Ana bate a palma da mão no chão ==== mata a formiga.
Olha para a palma da mão)

O que eu sinto não serve para se dizer ............ (  mineirinho_@Clarice Lispector  
Mas foi preciso falar .
Por isso cometi aqui um crime particular.

Afinal somos seres sonsos essenciais


Foto tirada do dia por um morador da rua